IMPACTOS DO PROCESSO DE NEOLIBERALIZAÇÃO, NO CONTEXTO DA INSERÇÃO DE QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL E ITINERÁRIOS FORMATIVOS, NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Roberto Eduardo Albino Brandão[1]

INTRODUÇÃO

É fato que as reformas neoliberais, especialmente destinadas à modalidade de educação de jovens e adultos (EJA), trazem mudanças curriculares significativas, tanto nas escolas de ensino fundamental, quanto nos colégios de ensino médio. Sob os discursos de melhoria na qualidade da educação, bem como evitar que o/a estudante, ao concluir sua etapa escolar, não consiga recursos financeiros suficientes para sobreviver, vai se legitimando o mesmo processo neoliberal na qualificação profissional (QP) e nos itinerários formativos (IF), estruturando o currículo em uma lógica mercantil de competitividade, individualismo, empreendedorismo e meritocracia nas escolas de EJA. Em contrapartida, embora o Projeto Político Pedagógico (PPP) seja uma obrigatoriedade legal, potencialmente capaz de elaborar propostas (populares) de QP e IF, assistimos uma pressão negativa às precárias tentativas de sua elaboração, quiçá de sua implementação, e quase nenhuma avaliação coletiva. Como esperar, da EJA, qualquer padrão de qualidade socialmente referenciada, se as mudanças curriculares, ao contrário de uma origem calcada nas discussões dos PPP, construídas no “chão das escolas”, são impostas por entidades/pessoas exógenas a EJA? Nosso propósito em relatar a experiência que tivemos, no ano de 2023 e até setembro de 2024, “tutorando” estudantes em QP e ministrando disciplinas voltadas aos novos IF, é desnaturalizar, aprofundar e externar as contradições acerca da hegemonia neoliberal, conforme evidenciada em diversas pesquisas especializadas nessa temática – Castro e Cruz (2024); Ventura (2011); Rummert (2007, 2019); Carvalho et all (2015), bem como através do movimento social Fóruns EJA Brasil em vários anos.

 

CAMINHOS METODOLÓGICOS

Considerando que o presente texto não possui caráter de pesquisa, o caminho metodológico utilizado para esta análise de experiência na EJA, no âmbito das políticas públicas para a educação (Municipal e Estadual do Rio de Janeiro/RJ), se dá através de situações reais vivenciadas pelo autor, enquanto professor de ciências e biologia da EJA. Esta vivência é corroborada por meio do exame documental, disponibilizado pelos poderes estatais e utilizado pelo autor em sala de aula, além da análise discursiva de gestores (membros da equipe diretiva das escolas e coordenações/gerências escolares), conforme procedimentos consensuados no âmbito da pesquisa “A IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA SAÚDE NA ESCOLA NO TERRITÓRIO DE MANGUINHOS (RJ): estratégias de privatização na política pública”. Utiliza-se do materialismo histórico-dialético, bem como da pedagogia histórico-crítica, como recursos para refletir criticamente a realidade vivenciada por professores e estudantes da EJA.

 

DISCUSSÃO E RESULTADOS

Partimos do pressuposto de que a ideia de concordância tácita na introdução de um modelo de QP e/ou IF, calcado no empreendedorismo, como fundamento pré-político, e então proceder ao debate daquilo que se relaciona apenas ao detalhamento da execução, e não de nossas (educadores e estudantes da EJA) convicções político-ideológicas, é uma práxis antidemocrática. O necessário debate político é, com frequência, substituído por um arremedo de participação, supostamente democrática, naquilo que é superficial, ou seja, sem abalar os fundamentos epistemológicos que impactarão o processo ensino aprendizagem. Essas discussões horizontalizadas sobre QP e IF, entre gestores, professores e estudantes, contrastam com a verticalidade das políticas públicas impostas à EJA, quase sempre implementadas de forma aligeirada e desprovida de fundamentos sócio-históricos, estão inseridas na confluência de forças que regem a luta de classes, que não necessariamente transformam as relações de desigualdade e/ou injustiça social. Nesse sentido, foi possível sistematizar alguns pontos controversos:

1- Foco no mercado de trabalho: a EJA passou a ser vista como uma ferramenta para preparar estudantes para o mercado de trabalho, embora o sistema capitalista não ofereça possibilidade de trabalho para todos/as. Nesse sentido, o empreendedorismo é frequentemente apresentado, ora como possibilidade de obter recursos financeiros para a massa de desempregados – “empreendedorismo de sobrevivência”, ora como se fosse algo para tirar o pobre estudante da “ignorância”. O próprio eminente relator do famoso Parecer CNE/CEB nº 11/2000, que trata das “Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos”, professor Carlos Roberto Jamil Cury, nega esse sentido empreendedor:

 “A função qualificadora, como está dita no Parecer, quer dizer, quando você preencheu todas as condições de uma educação formal superou a necessidade, por que o sujeito não tem o direito de desenvolver um talento pessoal, um talento próprio? Então eu gostaria de tocar violino. Vou aprender violino. […] É esse o sentido e não o de simplesmente dizer que agora você tem que ser empreendedor, esse tipo de coisa. Não tem nada a ver com isso. Pelo menos não era esse o sentido.” (FERNANDES & JULIÃO, 2021, p. 12)

2- Tecnicismo e pragmatismo: currículos mais técnicos e profissionalizantes, em detrimento de uma formação mais ampla e cidadã. Com isso, a formação básica vai sendo condicionada ao “bom êxito prático”, dispensando-se os fundamentos epistemológicos, inclusive sobre as origens do empreendedorismo, em contraponto ao “exército industrial de reserva”. Assim, o Estado cerceia a liberdade de elaboração do PPP, em detrimento da hegemonia neoliberal:

“[…] o que se observa nas escolas de EJA, é uma suposta solidariedade pragmática, principalmente no que é determinado pelos gestores. O PPP deveria originar-se, não como obrigação legal, mas como fruto de um debate fraternal e respeitoso de ideias, conscientes dos diferentes caminhos epistemológicos trilhados por todos/as em cada unidade escolar.” (BRANDÃO, 2023)

3- Gerencialismo e avaliação: A gestão das escolas passou a ser mais centralizada e burocrática, com foco em indicadores de desempenho e avaliações padronizadas e externas, ao priorizar a gestão de desempenho/otimização, ao invés da participação democrática. Isso pode ter limitado a autonomia das escolas de EJA, no que tange a gestão participativa e/ou de seus projetos e planejamentos coletivos, para atender às necessidades da classe dominantes.

4- Redução de investimentos: Os investimentos públicos na educação, especialmente na EJA, foram reduzidos, o que impactou a qualidade do ensino, a infraestrutura das escolas e a remuneração dos professores.

5- Privatização: Houve um aumento da participação de empresas privadas na oferta de educação, com a criação de escolas particulares e a terceirização de serviços nas escolas públicas.

6- Individualização do ensino: A ênfase passou a ser na responsabilidade individual dos/as estudantes pelo seu aprendizado, reforçada por mecanismos competitivos e de premiações, com menos foco em projetos colaborativos e/ou uma pedagogia mais dialógica.

Consequências:

Exclusão: As reformas neoliberais podem ter excluído ainda mais os jovens, adultos e idosos, com menos recursos e oportunidades, aprofundando as desigualdades sociais e a “desescolarização”, apesar dos esforços em chamada pública.

Precarização do trabalho docente: A precarização das condições de trabalho dos professores pode ter levado à desmotivação, ao adoecimento e à saída de profissionais qualificados na EJA.

Dificuldade em atender às necessidades específicas: A padronização dos currículos e das avaliações, consoante com as dificuldades impostas na elaboração dos PPP construídos de forma coletiva, pode ter dificultado a adaptação da EJA às necessidades e características inclusivas dos/as estudantes, que muitas vezes possuem trajetórias de vida diferentes, para além de suas necessidades especiais.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Espera-se que este texto possa ampliar a reflexão sobre como o neoliberalismo ameaça a participação democrática nas escolas de EJA, bem como os referenciais da educação popular. Assim, concordamos que a conclusão de Quissini (2016, p.171) nos parece bem atual e adequada:

“[…] os referenciais da educação popular e neoliberal são irreconciliáveis e, portanto, não podem compor nenhum tipo de equilíbrio no delineamento do horizonte pretendido pelas políticas de EJA, sob pena de que esse suposto equilíbrio se constitua num desequilíbrio permanente, no qual as bases que sustentam a educação popular permaneçam sempre em desigualdade em relação ao referencial hegemônico, afinal essa é a condição daquilo que é hegemônico.”

As reformas neoliberais na EJA, portanto, têm sido criticadas por diversos setores da sociedade, que as consideram um ataque ao direito à educação e um retrocesso em relação aos avanços conquistados nas últimas décadas. Os críticos argumentam que a educação deve ser vista como um direito social e não como uma mercadoria, capaz de gerar lucro, e que a escola deve ter um papel fundamental na formação de cidadãos críticos, conscientes e emancipados.

 

PALAVRAS-CHAVE: Política educacional; Neoliberalismo; Educação de jovens e adultos

 

Referências

BRANDÃO, R. E. A.. A implementação do Programa Saúde na Escola no território de Manguinhos (RJ): estratégias de privatização na política pública. 2014, 144 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Educação Profissional em Saúde) – Fundação Oswaldo Cruz. Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: <https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/8954>. Acesso em: 24 out 2024.

____________. A SOLIDARIEDADE NA CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO NAS ESCOLAS DE EJA: entre reformas, revolução e silêncio. 2023. Disponível em: <https://roberto.bio.br/blog/?p=447>. Acesso em: 24 out 2024.

FERNANDES, A. da P., JULIÃO, E. F. (2021). 20 anos das diretrizes curriculares nacionais da educação de jovens e adultos – conversa com Carlos Roberto Jamil Cury. E-Mosaicos, 10(24), 81–95. <https://doi.org/10.12957/e-mosaicos.2021.57738>. Acesso em: 24 out 2024.

QUISSINI, Á. R.. As políticas de EJA na América Latina em diálogo com a educação popular e oposição ao referencial neoliberal: leituras entre Brasil e Argentina. 2016. 185 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade da Região de Joinville, 2016.

[1] Professor de Ciências e Biologia, Mestre em Educação Profissional em Saúde. edu@roberto.bio.br.

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NOSSO INIMIGO COMUM

“bacteriografado” por Roberto Eduardo Albino Brandão

Imagem disponível em: https://jornal.usp.br/ciencias/novas-moleculas-inibem-enzima-importante-para-a-bacteria-da-tuberculose/

 

Olá Humanos!

Vocês me deram o nome de Mycobacterium tuberculosis, também conhecida como bacilo de Koch ou bactéria causadora da tuberculose.

Quero aproveitar esse importante veículo de comunicação popular, para passar nosso recado:

  1. Chegamos primeiro nesse planeta e, portanto, nos consideramos muito mais evoluídos que vocês, principalmente pela nossa capacidade de colaboração. Não somos “odiosos” para com nossos semelhantes (outras bactérias). Não fazemos guerra ou damos qualquer tipo de privilégio aos nossos irmãos. Inclusive, alguns humanos (africanos) copiaram nossa filosofia de vida: “sou o que sou graças ao que somos todos nós” (Ubuntu);

  2. Não é verdade que matamos pessoas. Ao contrário do que vocês pensam, não somos seus inimigos. Se algum humano morre, devido nossas “festinhas” nos pulmões do hospedeiro, morremos também. Da nossa parte, não há nenhum apego aos nossos hospedeiros, infectamos qualquer outro dos 8 bilhões mais próximo. Mas não gostamos de perder camaradas, apesar de nos reproduzirmos rapidamente. Portanto, o verdadeiro causador da tuberculose é nosso inimigo comum, embora mais de vocês do que de nós;

  3. Não temos nenhum preconceito contra qualquer tipo de humano. Infectamos todos, todas e todis. Somos trabalhadores também e estamos no ar e na moda. Porém, nosso inimigo comum faz com que a doença se espalhe apenas nos mais pobres. Acabamos com nossa “festinha” quando percebemos o início do tratamento da tuberculose, justamente porque precisamos do nosso hospedeiro vivo. Porém, em boa parte dos casos, nosso inimigo comum faz com que o hospedeiro não tenha condição de continuar com o tratamento até o final;

  4. Enquanto vocês tentam nos combater, com vacinação, antibióticos, dia “D” e/ou campanhas de informação, ou quaisquer outros paliativos, nós rimos muito disso tudo, pois nosso inimigo comum continua passando o rodo em geral, seja por tuberculose ou quaisquer outras iniquidades. Em nossas assembleias, consideramos que a medicina preventiva / estratégia de saúde da família, a pedagogia libertadora e a pedagogia histórico crítica, vem contribuindo fortemente para minimizar as causas da tuberculose, porém não resolve o principal problema, que é a desigualdade/injustiça social;

  5. Quem é nosso inimigo comum? É o mesmo que os comunistas/socialistas já vêm alertando a humanidade. Quem não precisa trabalhar para viver. Quem acumula a maior parte da riqueza produzida pela humanidade. Quem manda nesse planeta. Quem usa o poder para manter o capitalismo funcionando, apesar das crises e da miséria humana. A classe dominante!

Portanto, queridos humanos da classe trabalhadora, caso vocês não entendam o que é o caminho revolucionário, e/ou insistam na tentativa de conciliação entre trabalhadores e burguesia, continuem morrendo, mas nos deem preferência.

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O QUE CAUSA INCÊNDIO EM UMA ESCOLA E AS RELAÇÕES DE CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS

Fonte da imagem: https://blogdobarreto.com.br/em-meio-a-violencia-desenfreada-politicos-discutem-assuntos-que-nao-interessam-ao-povo/

Causa é aquilo que dá origem a alguma coisa. Consequência é o resultado de uma causa. Causa gera consequência. Portanto, em se tratando de uma escola, precisamos refletir sobre as relações de causas e consequências das políticas educacionais.

Iniciamos com a seguinte pergunta: o que causa incêndio em uma escola?

Seria o curto-circuito em algum aparelho? Não, isso é consequência da falta de uma política de adequação, manutenção e conservação das instalações elétricas.

Seria, então, a falta de responsável técnico? Não, isso é consequência das contratações (irregulares) de “amigos” dos gestores escolares.

Seria, então, incompetência da gestão? Não, isso é consequência da falta de democracia na escola: gestão pouco ou nada participativa e/ou ausência de eleição direta para diretor de escola.

Seria, então, irresponsabilidade do Conselho Escolar? Não, isso é consequência de o conselho possuir apenas caráter consultivo, e não mais deliberativo, além de ser cooptado pelo presidente nato do conselho – o próprio diretor.

Seria, então, falta de investimento? Não, isso é consequência da falta de um conselho deliberativo, cujo presidente seja de fato eleito por seus membros.

Seria, então, culpa do secretário, por não construir uma política de gestão democrática no chão das escolas? Não, isso é consequência de uma política da prefeitura que não admite liberdade de expressão dentro dos espaços escolares e/ou persegue professores por colocar cartazes, cujo senso crítico aponta contradições da ideologia neoliberal.

Seria, então, culpa do prefeito, por implementar a lógica neoliberal / meritocrática, não permitindo que a comunidade escolar reflita sobre seu próprio projeto político pedagógico (PPP). Não, isso é consequência da luta de classes, onde, nesse momento histórico, a correlação de forças não favorece aos trabalhadores.

Seria, então, falta de organização dos trabalhadores, por não rasgar o véu da alienação e contrapor a opressão da classe dominante? Não, isso é consequência das condições objetivas que condenam as massas priorizar seu tempo para a sobrevivência imediata e/ou morrer na guerra ao narcotráfico.

Seria, então, culpa de um estado que mata trabalhadores? Não, isso é consequência da política de segurança pública, que não consegue descobrir quem mandou matar a vereadora Marielle Franco.

Seria, então, culpa da Marielle? Não, de jeito nenhum, ela foi vítima desse sistema!

Seria, então, culpa do sistema capitalista, que mantém a escola pobre para pobres aceitarem a pobreza? É isso, encontramos mais do que a causa, adquirimos consciência política.

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HOJE EU SONHEI COM VONTADE DE REPRODUÇÃO

Fonte da imagem: https://praticassocioeducativas.blogspot.com/2014/09/reproducao-cultural-e-reproducao-social_29.html

Hoje eu sonhei com vontade de REPRODUÇÃO, de defender o patrão com total servidão. Se o sistema não é bom, pior não vai ficar, então melhor é continuar como está;

Sonhei que era insensível ao grito de Ana Paula (mãe de Jonhatha): “a dor de ter meu filho assassinado com um tiro nas costas. Essa luta não pode ser só minha”.

Sonhei que estava sozinho, em praça pública, gritando MERITOCRACIA, DESIGUALDADE, DETESTO POBRE;

Meus companheiros/as, indiferentes aos descasos dos governos, questionando o porquê de tantas assembleias de sindicatos e associações de moradores;

Os pragmáticos sendo enaltecidos por priorizar as tarefas imediatas (alienadas);

Os adeptos das pautas identitárias, dividindo forças na luta de classes;

Os comunistas, ilustres desconhecidos, perseguidos por “comerem criancinhas”;

A educação pública sendo pautada pelo movimento “Escola sem Partido”. Deputado Nikolas Ferreira Presidente da Comissão de Educação da Câmara;

A segurança pública como instrumento da necropolítica;

Os cristãos fazendo arminha. Negacionistas “explicando” os malefícios das vacinas;

Os neoliberais (meritocráticos) fazendo valer o espírito de competição em todas as áreas, pois essa sociedade não é para todos/as, apenas para os mais “esforçados” (homens, héteros, branco e ricos);

Os gestores públicos assumindo postura de “neutralidade” na luta de classes;

Todos os parlamentares “mitando” nas redes sociais. Política não se discute. Raízes do Bolsonazifacismo em nossa sociedade;

A democracia representativa inibindo a participação/organização dos trabalhadores em todos os cantos da cidade;

Pesadelo do pessimismo da razão!

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HOJE EU ACORDEI COM VONTADE DE REVOLUÇÃO

ARQUIVO 11/09/2017 ALIAS Lenin discursando no período pré-revolucionário (CRédito: Editorsa Zahar)

Hoje eu acordei com vontade de REVOLUÇÃO, de unir a foice e o martelo contra o patrão;

Acordei com vontade de gritar JUSTIÇA SOCIAL, IGUALDADE, FIM DA PROPRIEDADE PRIVADA, e da minha voz ecoar nas massas;

Meus companheiros/as, indignados/as com os descasos dos governos, lotando assembleias de sindicatos e associações de moradores;

Os pragmáticos, percebendo os fundamentos epistemológicos, discutindo dialeticamente os rumos dos movimentos sociais;

Os adeptos das pautas identitárias, reconhecendo que somos todos/as trabalhadores/as e que nosso inimigo comum é quem não trabalha e/ou não precisa trabalhar para viver;

Os comunistas, com orgulho, cantando A Internacional com todos/as irmãos/ãs trabalhadores/as mundo à fora;

A educação pública ampliando a consciência de classe;

A segurança pública indo atrás de quem lucra com a guerra ao narcotráfico;

Os cristãos seguindo, de fato, os ensinamentos do Cristo;

Os neoliberais (meritocráticos) constrangidos pela consciência crítica da cooperação x competição;

Os gestores públicos assumindo posição na luta de classes;

Todos os parlamentares, a exemplo da vereadora Luciana Boiteux (PSOL), prestando contas de seus mandatos e dialogando com toda gente;

A verdadeira democracia participativa tecendo redes em todos os cantos da cidade;

E eu me vejo flutuando em uma densa névoa vermelha… Daí me dou conta de que ainda não acordei. Talvez apenas um sonho (lúcido) que se sonha junto.

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PROJETO DE VIDA

Construção coletiva – turma 1001 – Prof. Roberto

Felicidade de quem tem um projeto de vida
Um futuro melhor exige sonhar e lutar
É um plano importante que motiva
A cada dia desafios a superar

Reflexões sobre a vida e como agir nela
É sobre transformar sonhos em realidade
Como ser escritor, diretor e ator de novela
Definindo seus objetivos e metas com longevidade

Projetar um futuro melhor, não depressível
Um plano que você cria para si mesmo, sem se isolar
Arquitetar um novo mundo possível
É saber aproveitar a vida escolar

Há quem diga que não chama a atenção
Que não representa nada
No futuro pode ser, mas hoje não
Será preguiça de pensar sua própria jornada?

Matéria que, se bem estudada,
fornece grande benefício futuro
Quem fizer um projeto de vida bem elaborado,
provavelmente atingirá o objetivo de enxergar no escuro

Eu quero fazer a diferença
No mundo em que eu vivo
Quero deixar a minha essência
E um legado positivo

Eu sei que não é fácil
Alcançar o que eu desejo
Mas eu não me deixo abalar
Pelo medo ou pelo desprezo

Eu busco aprender e crescer
Com as experiências que eu vivo
Eu procuro me conhecer
Dialogar e me expressar com sentido

Poder projetar o que vamos fazer da vida
Nos dá força e esperança
É uma missão que nos guia
Nosso futuro comum a cada nova andança

É sobre construir uma vida plena e significativa
Costurar nosso projeto de vida com respeito ao próximo
Traz a possibilidade de conceber e plasmar iniciativa
Nosso projeto de vida coletivo importantíssimo

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ENTÃO É NATAL (2023), E O QUE VOCÊ E EU FIZEMOS?

Governo vem, governo vai
E a escola pública continua partida
Estudante passa, estudante sai
E o povo continua votando em fascista

Milei eleito com desrespeito
Trump ressurgindo das cinzas
Inelegível fazendo campanha com pré-conceito
E o que fizemos diante das incertezas?

A Eja tem encantos permanentes
Nem mesmo a aposentadoria será capaz de apagar
Respeito e aprendizado docente
É fácil aprender com quem está disposto a ensinar

É fácil ensinar para quem quer aprender
Ouvir o que não é dito, nosso desafio do céu
A escola é chata, eu não quero escrever!
É difícil entender o anjo Gabriel

Aula na Eja é participação
No Brasil, estudante é coisa rara
Atenção, reflexão e ação
Renan, tu és o cara

87 anos de história
Inspiração cativante
Força, foco e vitória
Teu nome é José Estudante

Poesias periféricas tem o poder
De melhorar a vida dos que agem
Com responsabilidade na tarefa de escrever
Descobrem o valor da linguagem

Aos estudantes queridos
Minha eterna gratidão
Aos colegas de trabalho adquiridos
Punho (esquerdo) erguido com vermelhidão

No pátio da escola, em uma bela manhã de primavera
O passarinho agoniza e morre. Esquecemos?
Morreu de alimentos ultra processados, a ciência pondera
Enterra o caso, foi o que fizemos

Nós povo já nascemos pobres (na cela)
Porém, não nascemos livres (da fome)
Na poética Liberdade, de Marighella:
“[…] se torturado for, possa feliz, indiferente à dor, morrer sorrindo a murmurar teu nome

Não faltou projeto, mas o político pedagógico é naftalina
Não faltou disposição, mas pela qualidade estamos ralando
Não faltou centro de estudos, mas não estudamos com disciplina
Não faltou operação policial, mas a insegurança continua assolando

Não faltou ação, mas a educação continua peça publicitária
Não faltou diálogo, mas dialética não combina com coca-cola
Não faltou antirracismo, mas ainda sem superação da pauta identitária
Não faltou PSE, mas é distante a saúde na escola

Não faltou engajamento, da humanidade, contra as guerras
Não faltou grupo de Zap, um pouco melhor que solidão
Não faltou violência contra as mulheres, inclusive nas palavras
Não faltou indignação, quando houve apagão

Não faltou discurso de ódio e mensagem sem noção,
Tudo bem se é piada ou até post sem graça
Mas a dúvida sempre recai, sobre as tentativas de desalienação, quando gera reflexão
Essa triste interação é pedrada na vidraça

Não faltou sala de aula quente e barulhenta,
mas os gestores (nível central) receberam 14º salário
Não faltou papel, caneta e nem ferramenta,
mas a educação especial não se resolve com voluntário

Faltou organização (política), mas seguimos esperançando
Faltou camaradagem, mas seguimos na luta
Faltou pão, mas seguimos, no circo, dançando
Faltou consciência de classe, mas nos educamos na labuta

Entre pássaros e gaiolas,
fica a certeza de que o canto dos pássaros
é capaz de destruir as grades das gaiolas
Dominar os donos das gaiolas (bárbaros)

Entre combustível das críticas e comburente do silêncio,
fica a certeza do dever cumprido nas promessas
Se não incendiamos a selva capitalista,
ao menos alimentamos o calor das massas

Entre professores e reprodutores de aulas,
fica o otimismo da vontade de uma revolução possível
Entre o letramento científico e o mundo das fábulas,
fica a intolerância e o fake news visível

Vim, vi e não venci, mas não me dobrei aos vencedores
Falei, chorei e adquiri uma fenda vocal, mas não morri (ainda) de depressão
Colaborei, produzi e critiquei mercadores,
mas foi pouco no sentido da nossa própria desalienação

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SE OS TUBARÕES FOSSEM HOMENS [Adaptado do texto de Bertold Brecht, de mesmo título]

Se os tubarões fossem Homens, eles organizariam a sociedade dos peixes em 2 grupos: peixes menores (nadadores) e tubarões (não precisavam nadar para sobreviver). De tal modo que, os poucos tubarões existentes manteriam, ora através da força e ora através da cultura, um fluxo constante de oxigênio e alimentos (os próprios peixinhos) chegando até eles. Nesse contexto, além dos meios de produção da própria existência, bem como dos peixinhos (maioria da vida aquática), os tubarões dominariam os mares e rios, mantendo as correntes marinhas e fluviais fluindo em seus próprios benefícios. Há quem diga que essa seria a verdadeira natureza dos tubarões, porém nem sempre foi assim. Historicamente, todos os peixes eram herbívoros.

Se os tubarões fossem Homens, eles mandariam peixinhos criarem leis. Tais regras diriam que todo peixe é igual, porém, na prática, os tubarões sempre levariam vantagem, já que eles dominariam os fazedores das leis, os canais de informação e comunicação, as polícias, os exércitos, e a sociedade de modo geral. Inclusive, os peixinhos não desconfiariam da dominação dos tubarões. Os peixinhos acreditariam nessa falsa liberdade, enquanto os tubarões engoliriam pouco a pouco enormes cardumes de peixinhos, que nadariam felizes para suas bocas, cantando “borbulhas de amor”. Nesse mundo de ilusão, os peixinhos duvidariam da ciência, que comprovaria a verdadeira intenção dos tubarões, mas teriam a certeza de que a corrupção e sofrimento é culpa dos PT (peixes-traíras). Também haveria religião, onde os tubarões escreveriam mandamentos, como sendo a vontade do Deus Netuno. Tais mandamentos ensinariam que o sofrimento levaria a vida eterna – na barriga do grande tubarão branco celestial.

Se os tubarões fossem Homens, não iriam de um canto para outro nas correntes dos mares, como todo peixe normal. Eles andariam em luxuosos iates, para não se misturar com a massa dos peixes. Afinal, alguns peixes nem acreditariam em tubarões, já que os tubarões ficariam escondidos no PL (paraíso liberal) ou no NOVO (naufrágio de oportunidade para vender opiniões), situados nas fossas abissais. Os peixinhos (doces) dos rios disputariam com os peixinhos (salgados) dos mares, para ver quem nadaria mais rápido. Os tubarões ficariam felizes ao observar competição entre os peixinhos, pois, quanto mais os peixinhos se de gladiavam, mais recursos os tubarões garantiam e acumulavam. Haveria prêmios para os melhores nadadores – lindas medalhas de algas, ornamentadas com coentro e pimenta, que aumentariam o apetite dos tubarões. Haveria também colaboração entre os peixinhos, porém toda solidariedade seria para manter os peixinhos dentro da correnteza que direcionariam todos ao mesmo sentido – engordar os tubarões.

Se os tubarões fossem Homens, eles fariam os outros peixes acreditarem no mito do peixinho salvador, capaz de trazer uma vida mais feliz para todos os peixes. Seria uma grande enganação, já que os tubarões usariam dessa estratégia apenas para manter os peixinhos desorganizados, sem discutirem um projeto de vida aquática elaborada coletivamente. Alguns peixinhos gritariam por REVOLUÇÃO, outros por REFORMAS, porém todos seriam rotulados como vermelhos e sofreriam duras sansões. Nesse sentido, os tubarões manteriam viva uma suposta ameaça vermelha, ainda que a maior parte dos peixinhos nem soubessem o que seria esse tal pigmento vermelho, como forma dos peixinhos não conversarem sobre qualidade de vida para TODOS os peixes. Os tubarões permitiriam que os peixes oprimidos construíssem escolas para jovens, adultos e idosos peixinhos, inclusive reservariam recursos para a criação e manutenção dessas escolas, como forma de conter a revolta dos peixinhos com tanta miséria e desigualdade. Essas escolas seriam bem diferentes das escolas dos tubarões. As escolas dos peixinhos ensinariam a nadar direitinho, com sensação de liberdade, preferencialmente sozinhos, sempre na correnteza dos rios e nas correntes marinhas, obedientes a lei e a ordem, e seguindo tradições e bons costumes. Enquanto nas escolas dos tubarões ensinariam a manter a estrutura social vigente, ou seja, manter os peixinhos nas correntes que levam diretamente as enormes bocas dos tubarões.

Se os tubarões fossem Homens, chegaria o dia em que não haveria correntes para tantos peixinhos e, aos montes, eles iriam morrendo em águas estagnadas, sem ao menos satisfazerem a farra gastronômica dos tubarões. Imediatamente, após esse dia, os tubarões perceberiam um sabor amargo na água, e também nos peixinhos, através de Floração de Algas Nocivas, também conhecida como Maré Vermelha. Nesse dia, os peixinhos tomariam consciência da sua condição de “nadador para bocas de tubarões” e nadariam segundo suas próprias direções. Nesse lindo dia, os tubarões reconheceriam que também são peixes.

Assim funcionaria o capitalismo aquático, se os tubarões fossem Homens.

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A SOLIDARIEDADE NA CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO NAS ESCOLAS DE EJA: entre reformas, revolução e silêncio

Fonte da imagem: http://www.ivancabral.com/2009/03/charge-do-dia-nota-baixa.html

 

Por Roberto Eduardo Albino Brandão

 

Em uma simplória tentativa de sistematização das intervenções em reuniões de professores, ao longo desses meus 25 anos de magistério, com foco na participação em temas polêmicos, observo os reformistas, que acreditam em pequenos ganhos naquilo que se entende por qualidade na educação, os revolucionários que lutam por mudanças estruturais (dominar os dominantes), e os silenciosos, que se calam principalmente diante da opressão, seja porque desistiram de lutar e/ou não acreditam em classe dominante. Nesse contexto, com o advento do artigo 12 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 9394-96), “Os estabelecimentos de ensino respeitando as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de elaborar e executar sua proposta pedagógica”, surge a obrigação (legal) desses profissionais da educação, junto aos estudantes e comunidade, em cada unidade escolar – UE, dispor do seu Projeto Político Pedagógico – PPP.

É evidente que esse processo de Planejar e construir um PPP, principalmente em escolas de Educação de Jovens e Adultos (EJA), onde os sujeitos foram privados do direito à escolarização, pressupõe diálogo, respeito ao pensamento divergente, diálogo, escuta atenta, diálogo, paciência histórica, diálogo, disputas ideológicas, diálogo, exposição de contradições e diálogo. Nesse sentido, esse texto trata da insistência no diálogo (sensível) em torno do PPP e poderia ser intitulado: “PODE PROFESSOR DA EJA FALAR? Considerações sobre a existência (ou não) do projeto político pedagógico – PPP”, a semelhança do capítulo de livro[1]: “PODE ESTUDANTE DA EJA FALAR? Experiências de jornal estudantil em uma escola pública periférica”, que segue os mesmos embates ideológicos refletidos nesse texto. Não pretendo entrar no mérito de como as escolas públicas e/ou seus gestores encontraram caminhos de apresentar PPP, como num passe de mágica, em atendimento estrito a sua obrigação legal, sem participação efetiva de toda comunidade escolar. Mas precisamos nos perguntar, o que é um PPP? Para Gadotti (1994, p. 579)[2], nesse processo dialógico de gestão democrática:

Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma nova estabilidade em função da promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus autores e atores.

Seguindo essa linha de raciocínio, se considerarmos que todo PPP deveria romper com o tempo presente, e que o tempo antes da pandemia de covid 19 é diferente do tempo presente, é possível afirmar que o PPP, outrora construído, ainda existe? O que significa considerar um PPP com mais de 1 ano, ainda que sem proposta metodológica de revisitação/alteração/atualização, sem uma avaliação participativa (objetiva ou subjetiva), sem que se leve em conta o querer, o saber e o fazer de todos/as? O PPP está localizado na gaveta da direção da UE ou nos corações e mentes da comunidade escolar? Os reformistas e os silenciosos entendem que as realidades educacionais e sociais sofrem modificações? É possível falar que a escola tem um “PPP antigo”?

Penso que as respostas para essas perguntas estão em nossa capacidade de “co-laborar” coletivamente para a superação do sistema (capitalista). Esse sistema, repleto de determinantes sociais, tenta nos paralisar, embaçar nossa visão e atrapalhar nossa formação política. Ou seja, fugimos do debate franco e aberto, nos perdemos em conflitos interpessoais, e não discutimos o que realmente importa, que é a educação emancipatória de nossos estudantes. Para Rummert[3] (2011, p. 157):

Os alicerces de tal proposta pedagógica não se constroem no âmbito das ações em curso para a educação de jovens e adultos trabalhadores marcadas por um caráter subordinado aos padrões atuais de sociabilidade definidos pelo capital.

De fato, o que se observa nas escolas de EJA, é uma suposta solidariedade pragmática, principalmente no que é determinado pelos gestores. O PPP deveria originar-se, não como obrigação legal, mas como fruto de um debate fraternal e respeitoso de ideias, conscientes dos diferentes caminhos epistemológicos trilhados por todos/as em cada unidade escolar. Penso que tal amadurecimento político, principalmente no que se refere aos processos formativos no chão da UE define, em parte, a qualidade das ações desenvolvidas por cada UE. Como são os espaços formativos da sua escola, como por exemplo os centros de estudos – CE? Os professores pensam coletivamente sobre o que precisam saber para melhorar a qualidade do trabalho da UE? Há reflexões de caráter formativo e coletivo ou apenas questões pragmáticas acerca da burocracia escolar? Já ouviu falar em “CE individual”? Quem constrói as pautas dessas reuniões? Quem faz os relatos e como são disponibilizados/consultados? Qual o nível de envolvimento político dos docentes em defesa da EJA?

Para os revolucionários, é importante não mascarar os conflitos, mas evidenciá-los e explorá-los no sentido formativo, onde o PPP representa essa real possibilidade. Todavia, pensar as formas com que as discussões se dão, para além da metodologia de construção do PPP, precede o início de sua elaboração. Um dos problemas é a falta de DIALÉTICA. Como professor, ativista político em prol da EJA, noto, em reuniões “pedagógicas”, a falta do pensamento dialético. Nesse sentido, é importante considerar, em cada reunião pedagógica, que existem vários pontos de vistas (em disputa) sobre um determinado assunto, além das opiniões da equipe gestora da escola. A força resultante dessa disputa (luta) pode reforçar o lado dos trabalhadores ou o lado da classe dominante. Nesse sentido, a quem interessa a existência de um PPP de gaveta (que não dialoga com a realidade social dos/as estudantes)? Quem lucra quando um professor acusa outro de ser autoritário? A turma do silêncio sempre reforça o lado de quem está ganhando (hegemonia). Seria extremamente importante, na medida em que defendemos uma posição, também falar sobre como chegamos até aquele argumento, justificar os interesses (de classe) envolvidos, bem como aquele argumento se insere na LUTA DE CLASSES. Se, ao contrário, fizermos um debate aligeirado, desprovido de fundamentação e, além disso, considerarmos nosso companheiro de embate teórico, como um oponente/inimigo, rotulando-o com adjetivos desnecessários, certamente não avançaremos no debate dialético.

Portanto, não há luz no fim do túnel para a construção do PPP, que não seja o trem em sentido contrário para atropelar a classe trabalhadora. A realidade concreta mostra o caminho “moderno e espetaculoso” da alienação (visão superficial e distorcida da realidade), quando não atentamos para a comunicação dialética, produzindo e reproduzindo as mazelas sociais que tanto criticamos. Atribui-se mais atenção ao plano de gestão (da direção), ao plano de ação (de poucas mãos), do que ao PPP verdadeiramente democrático/participativo. E, com isso, vem o adoecimento/sofrimento mental, tão comum atualmente. Somos diversos, seja de direita ou esquerda, seja liberal, social-democrata ou comunista, seja religioso ou ateu, seja morador de favela ou do asfalto, tenha concluído a educação básica ou não, somos seres humanos em processo de humanização. Podemos até dizer que estamos no mesmo “barco”, porém, alguns ainda tentam (em vão) conter a entrada de água na rachadura do casco do barco, enquanto outros ainda não sabem que o barco está afundando, e que não há salva-vidas para todos. Ou seja, não nascemos humanos, nos tornamos humanos (ou não) nas interações (políticas) que fazemos. No caso da EJA, se entre professores já é conflituosa a interação, mais conflituosa ainda é a interação política entre professores, sobretudo os acríticos e os estudantes jovens, adultos e idosos, que trazem uma bagagem de “certezas” cristalizadas em suas historicidades e/ou a negação da política. É como trocar “óculos velho” por “dentadura quebrada” e continuarmos sufocados por reformas que modificam apenas a aparência. Assim, a solidariedade se dá apenas naquilo que é funcional ao sistema:

Seguindo as reflexões sobre concepções e análises de políticas públicas pelo viés marxista, bem como as suas metodologias, observa-se que algumas teorias se confirmam: a educação de jovens e adultos, como vem sendo hoje ofertada, é excludente e, para não ser radical, raramente é construtora de cidadãos críticos. Ao contrário, é uma forma bastante eficaz para manter o poder da burguesia e respaldada por políticas públicas, logo está legitimada pelo Estado – isto é, um Estado a favor do poder hegemônico que impede a emancipação da classe trabalhadora. (SILVA, 2020, p.19-20)[4]

Viver a luta de classes não é o mesmo que se posicionar (estabelecer estratégias coletivas). Viver a luta de classes todos vivemos, e sofremos com ela. Mas se posicionar significa pensar e agir com consciência de que fazemos parte da classe oprimida (trabalhadora) e que, portanto, a dialética é essa interação política que nos permite uma visão ampliada da realidade. Promover o pensamento dialético, em prol da emancipação humana, não é tarefa fácil. Fácil é morrer de overdose! Parafraseando a canção de Cazuza “Ideologia”, eu digo que meus heróis ainda vivem, apesar da overdose… eh, meus amigos estão no poder.

Ao refletir sobre como estamos interagindo, enquanto classe trabalhadora, sem idealização, com respeito ao pensamento divergente, através de uma abordagem de vários pontos de vista, inserida na luta de classes, nessa escuta atenta em que não há “dono da verdade”, estamos nos ajudando (sendo solidários) no enfrentamento das violências e na promoção da saúde e da intersetorialidade. Assim, dizer que não há um PPP na escola, ainda que digam que há um “PPP antigo” é agir na ruptura do antigo e abrir espaço para o novo. Não quero, com isso, desprezar a história, apagando os esforços anteriores, e sim enfatizar o momento presente, com as pessoas de hoje, na superação do caráter compensatório e assistencialista da EJA no agora, com a firme intenção de emancipar a classe trabalhadora. Tenho um profundo respeito por quem pensa diferente, porém, respeito ainda mais os que não se furtam ao debate franco e aberto, sem paixões, com o objetivo de fazer boas sínteses, ainda que provisórias.

[1] Disponível em: https://drive.google.com/file/d/1R7Eg1xBkL7dWTjK-Q28h0BRhuqhD6bFs/view?usp=share_link

[2] GADOTI, M. Pressupostos do projeto pedagógico. Anais da Conferência nacional da Educação para Todos. Brasília: MEC, 1994. Disponível em: https://repositorio.usp.br/directbitstream/60b90f87-e2ec-44d3-8c2a-2d5555706aaa/Pressupostos%20do%20projeto%20p… Acesso em: 29 abr 2023.

[3] RUMMERT, S. M. Educação de jovens e adultos trabalhadores e a produção social da existência. In: CIAVATTA, Maria; TIRIBA, Lia (org.). Trabalho e Educação de Jovens e Adultos. Brasília: Liber Livro; EdUFF, 2011. p. 137-163.

[4] SILVA, Tiago Dionisio da. A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS TRABALHADORES NA REGIÃO METROPOLITANA DO RIO DE JANEIRO: DESTITUIÇÃO DE UM DIREITO. Disponível em: https://periodicos.ifsc.edu.br/index.php/EJA/article/view/3039

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DIZEM POR AÍ, NOS ESPAÇOS DE EDUCAÇÃO DE JOVENS, ADULTOS E IDOSOS… (Versão 6.0 – revista e ampliada)

por Roberto Eduardo Albino Brandão

 

A educação é capaz de dominar ou de libertar, diz a história

“A Eja” é direito, diz a gramática

“O Eja” é gasto, diz a elite do atraso

A escola pública sofre com a precarização, diz o trabalhador

A escola privada reproduz privilégios, diz a burguesia

Lutar pela escola unitária, diz o comunista

Premiar conforme os méritos pessoais de cada indivíduo, diz o secretário

Escola é lugar de todis, diz a constituição

70 milhões de brasileiros ainda não concluíram a Educação Básica, diz a matemática

Fome cresce no mundo e atinge 9,8% da população global”, diz a ONU

Escolas reproduzem a violência estrutural de forma acrítica, diz a sociologia

O sistema capitalista “destrói a natureza, destrói o trabalho e destrói a classe trabalhadora”, diz o XVII ENEJA

É possível um capitalismo humanizado, diz o social-democrata

Precisamos aumentar os lucros, diz o capitalista

Formar políticos que reproduzam nossa ideologia, diz (e age) a classe dominante

Otimizar (no sentido de fechar) turmas de Eja, diz o político neoliberal

Vamos cumprir as ordens, sem questionar, diz o gestor da educação

Os alunos da Eja não querem nada, diz a direção da escola

Levei um tapa na cara do “poliça”, diz o estudante da Eja

Não consigo arranjar emprego, diz o cidadão

Desisti de procurar emprego, diz a pessoa em situação de rua

Por que um garoto (preto) anda nas ruas da favela a essa hora, diz o policial

É o mistério e/ou vontade do divino, diz o religioso

– Professor, já buscou atendimento profissional em saúde mental? Pergunta a coordenadora pedagógica

Tratar os sujeitos com remédios modernos, diz (e lucra) a indústria farmacêutica

Tratar a sociedade do consumo com consciência de classe, diz a psicologia histórico-cultural

Capitalismo é a doença, necropolítica é um dos sintomas, diz a ciência

É assim mesmo, não adianta lutar, diz a professora conservadora

Só a luta muda a vida, diz a professora (da Eja) militante

Não temos pernas para movimento de massa, diz o pesquisador da Eja

Temos muitos pesquisadores da Eja para movimentar as pernas, diz a massa

Vamos estudar coletivamente e discutir nosso projeto político pedagógico, diz o professor comprometido com a emancipação da classe trabalhadora

Cresce a revolta popular e o ódio de classe na direção da REVOLUÇÃO, diz o movimento social…. ops, isso não pode dizer!

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